quinta-feira, 21 de julho de 2016

Avesso

Andar pelo simples sustento de caminhar
Atravessado por sentimentos
Sem temor ou arrependimento
Andar para esquecer mas no fim recordar
Gestos tão incríveis que o coração não sente
Sempre em suor no corpo esbatido
Sempre cansado, sempre abatido
Mais dois passos e é o fim
Mais um sopro e não me vejo em mim
E descanso e sou púrpura
Afasto o que de mim não sinto
Sigo pelo caminho feito
Sigo por onde não vejo
E vou por onde não sou
Até ser o que não sou de novo
Fico onde me largo caído
Num choro contido e fingido
De ser por demais perseguido
Por memória que me acompanha ao alvor
Não tenho por onde esquecer
Não tenho por onde fugir
Fingir só a dor que não sinto
Morrer só na mente que é insana
Propenso ao meu amor eu me ato
Num pacto que de sangue me queima
Finjo no ser que coíbe o sentir
Pantomima de estar e de agir
Sempre no mesmo não estar
Como que a fingir o pensar
Ave esvoaça e distrai
Do peito soluça uma lágrima
E caio prostrado na cama
Acordar é medo patente
Frustração é mais que evidente
E não nego, tudo nego
Lançar um pé no encalço do outro
Mover o corpo num espaço
Querer mais que este cansaço
Na fuga de me ser sem esforço
E são horas na bonomia
Numa letargia sem fim
Onde inerte me esqueço de mim
Esqueleto de dias por vir
Atroz me dás um pensamento
Morrer é bem mais que sorrir
E de alento me fecho por dentro
Coragem repito na cegueira
E crepito em meu lume aceso
Não estou não faço, acontece
No avesso de mim só um preço
Preço a pagar por loucura inegável
Tangível só o embaraço
Horas de infundada navegação

Atroz mente que se trai desperta

Sem comentários:

Enviar um comentário