"Aqui na minha frente a folha branca do papel, à
espera; dentro de mim esta angústia, à espera: e nada escrevo. A vida não é
para se escrever. A vida — esta intimidade profunda, este ser sem remédio, esta
noite de pesadelo que nem se chega a saber ao certo porque foi assim — é para
se viver, não é para se fazer dela literatura."
Miguel Torga
Quando me fizeram a proposta para
participar no projeto da HOP! “Mulheres de Abril”, pensei
instantaneamente, altamente, eu sou,
filho de uma, neto de duas, bisneto de outras duas, sobrinho para cima de
muitas e conhecido de outras tantas. Só isso era para aí... Um “maralhal”, um
maralhal de mulheres que representam Abril, Um Abril, Uma Ideia, Um Cravo, Uma
Era.
Assombra-nos ainda um passado,
uma coisa meio estranha, o dito por dizer...
O Dito dessas mulheres de capitães, mães de mães e outras
mães, essas mulheres que carregaram no corpo os corpos que por aí se lançaram
em revoluções mil, antes e depois de Abril e que ainda se lançam, abismos
dentro com a esperança de trazer mudança, de revigorar a esperança..
O desafio
era gigante, foi e é ainda, pois não é só o que fica nos ecrãs que é digno de
ser narrado, é o que por trás se passa, o que nos bastidores se encontra,
tantas histórias, de Abril, de Maio e de Janeiro, histórias para encher um ano
inteiro, histórias do Passado, do Presente e do Futuro, que parece tão escuro,
mas é mesmo só isso, aparência.
Fascinou-me o poder mágico de viajar no tempo com a câmara de filmar, este dar e tirar vida, este respirar, expiar e inspirar, tanta, tanta gente.
Estas
mulheres, por exemplo, estas mulheres mudaram, ganharam vida, mais vida ainda,
saem-nos da memória e renascem na tela de uma televisão, nas polegadas de um
ecrã, ficcionadas, mas tão vivas, vivas pelo menos a partir de hoje, no nosso
imaginário colectivo, esse sim, que se quer rico, pleno!
Por mais que tente, não consigo traduzir o prazer que foi para mim
participar neste projeto, tão cheio de “revisitações”, tão frescas, tão frescas
que estavam nos mais velhos, como sedentas por serem revisitadas, repensadas, pelos mais novos.
Hoje, mais
que nunca, é preciso pensar naquele Abril, aquela coisa gentil que é sair sem
temor de um torpor de décadas, um torpor angustiante de hábitos, vícios e
costumes e sair sem ira, sair como quem ia á praça ouvir a vida pelas bocas dos
vivos, ouvir e ver o mundo com os olhos e ouvidos bem livres, sem censuras, sem
perseguições e dissabores! E digo que é importante pensarmos em Abril hoje,
porque é hoje que vivemos e amanhã será hoje também, se lhe dermos tempo
Um muito Obrigado a toda a
Equipa, todos eles sabem quem são!
Ricardo Leite