Já não sofro com mais
nada
Preguem-me os pés á
tábua,
Não os posso usar!
Preguem-me as mãos á outra tábua,
Já não as posso usar.
Já nada me dói, nem a
dor me dói!
Coloquem-me a coroa
de espinhos
A cabeça já não a
posso usar!
Não sei ser como os
demais,
Tenho no peito algo
diferente.
Já não tenho nada a
perder,
Nem a vida me podem
tirar
Não a tenho, perdi-a
nas finanças
Nas seguranças
sociais,
Para pagar tudo o que
devo,
Devo a vida e mais um
pouco.
Já nem pensar posso,
tenho a mente presa em abismos
Para ser em
conformidade tenho de usar estrangeirismos
Enfadam-me os silogismos
com que vestem a minha pele
Deixei de ser pessoa,
Deixei de ser quem
sou,
Deixei de ser e não
há seres novos para se ser
O que resta é ficar
aqui pregado,
A ver-me ser
mastigado, por um povo atordoado
Que não sabe de seu
fado que cravo há-de cravar.
Já morri e nem sabia,
Tiraram-me a vida á
nascença
Saí de uma toca
escura directo para uma adolescência
Que desaguou numa
maior idade que subsiste de subserviência.
Não existem minorias,
Não existem maiorias,
Não existe nada
E no meio do nada, a
única coisa que serve de acalento,
Pão pra boca, é saber
que de tão fundo só sobe.
Sem comentários:
Enviar um comentário